No Brasil sempre escutamos o ditado popular “em briga de marido e mulher ninguém bota a colher”. Durante muitos anos esse ditado foi seguido à risca e as pessoas faziam de conta que nada viam e nada escutavam. Com esta atitude omissa, a violência só aumentou.
A violência contra a mulher sempre foi considerada um assunto banal, o comportamento machista por parte inclusive de algumas mulheres sempre favoreceu a escalada da violência e o tema era tratado pelo Estado de forma insatisfatória. Comum era ouvir das vítimas que tão humilhante como buscar a punição de seus agressores era vê-los saírem dos tribunais como vitoriosos doando uma cesta básica como pena-prêmio pela agressão.
A Lei 11.340 de 2006, batizada como Lei Maria da Penha, colocou fim ao prêmio concedido aos agressores, possibilitando que fossem presos em flagrante e tivessem a prisão preventiva decretada, proibindo a aplicação de penas alternativas (cestas básicas). No entanto, os casos de violência doméstica não cessaram.
Como um instrumento de maior garantia à mulher em 9 de março de 2015, foi sancionada a Lei 13.104 que inseriu uma qualificadora ao crime de homicídio, criando o tipo penal do feminicídio, ou seja, o assassinato cometido em razão da vítima ser uma mulher.
A pena para quem cometer Feminicídio será aumentada de 1/3 até a metade se o crime for praticado durante a gestação ou até três meses após o parto, se a vítima for menor de 14 anos ou tiver mais de 60, se for deficiente o ainda se for cometido na presença de descendente ou ascendente da vítima.
Essa Lei complementa a Lei Maria da Penha e apesar de estar em vigor, o número de mulheres mortas não diminuiu. O feminicídio infelizmente cresceu de forma desenfreada no Brasil.
O feminicídio, na maioria dos casos, é o resultado de uma morte anunciada. A mulher inicialmente é ameaçada verbalmente pelo companheiro, mas perdoa, pois acha que é apenas um comportamento isolado; depois é agredida fisicamente, no entanto as lesões são de natureza leve e sempre vem acompanhada de uma promessa de que nunca mais a atitude se repetirá e mais uma vez a mulher perdoa. As agressões aumentam e passam à natureza grave, mas o medo de procurar ajuda, a vergonha por passar pela humilhação e enfrentar o julgamento de algumas pessoas próximas, impedem que a mulher denuncie o agressor.
Some-se a essa situação que em muitas oportunidades as vítimas deixam de denunciar o agressor e procurar ajuda, pois dependem financeiramente do companheiro ou do marido. E aí chegamos a uma violenta escala ascendente de agressões e a mulher é assassinada.
A violência contra a mulher pode se dar de inúmeras maneiras, podemos citar alguns exemplos: a violência física representada por ações como tapas, empurrões, socos, mordidas, chutes; a psicológica onde o agressor com suas atitudes diminui a mulher, fazendo com que a mesma sempre se sinta inferior ao companheiro, impedindo seu crescimento profissional e pessoal, incluindo ações como insultos constantes, humilhação, desvalorização, isolamento de amigos e familiares; a violência sexual a qual ocorre por meio da força física, obrigando a mulher a ter relações sexuais ou presenciar práticas sexuais contra a sua vontade e a violência patrimonial onde o agressor retém, subtrai, ou destrói os bens pessoais da vítima, seus instrumentos de trabalho, documentos e valores, obrigando a mulher a entregar todo seu salário e renda ao marido/companheiro que controla tudo e usa como quer sem permitir que a mulher gaste o dinheiro com ela.
E como cessar essa violência? Creio que o caminho é a solidariedade e a intromissão alheia sim, principalmente a intromissão familiar. A sociedade como um todo e a família, deve ficar atenta aos comportamentos agressivos dos namorados, maridos e companheiros dos filhos e tomar as medidas legais disponíveis. A vítima e seus parentes e amigos mais próximos devem pedir orientações no atendimento gratuito realizado pela OAB ou Defensoria Pública, ou consultar um profissional de sua confiança, procurar Delegacia de Defesa da Mulher, buscar orientação sobre o que e como fazer a denúncia.
As providencias e as medidas protetivas de urgência são tomadas com base na Lei Maria da Penha, tudo para conferir a segurança a mulher e aos filhos se necessário. Após todos esses trâmites na maioria dos casos o agressor é afastado e inicia-se o processo criminal e o divórcio se o caso.
No entanto, apesar da previsão legislativa, em muitos casos há violações das medidas protetivas e a mulher acaba sofrendo nova agressão. Foi o que ocorreu em nossa cidade, na última quinta feira.
A solução para que as medidas protetivas não sejam violadas poderia vir do Poder Público local, que através da Guarda Municipal, poderia implantar o sistema de vigilância e monitoramento que já funciona em outros Municípios, criando mecanismos de defesa para que a vítima avisasse a guarda Municipal e esta a Polícia Militar quando o agressor tentasse violar a medida protetiva, para que as medidas cabíveis fossem tomadas de maneira mais efetiva.
Não podemos nos esquecer também que infelizmente, há casos em que a mulher, se utilizando de possiblidades legais, como no caso de ameaças, frauda situações para prejudicar o homem, seja em razão da disputa pelos filhos, seja pelo simples descontentamento com o fim do relacionamento, por mera vingança, etc. Essa realidade é chocante, pois algumas mulheres maculam a Lei que as protege por sentimentos de vingança.
A violência em si é escabrosa, matar por se sentir superior a alguém é algo que fere a alma e as leis divinas. A promulgação de Leis para proteger as mulheres é algo forte e importante, porém revela a pequenez do homem e da sociedade em que vivemos. Não podemos esquecer que as pessoas só dão o que possuem; onde não há amor, respeito e compaixão, matar o próximo é um ato banal.
SOBRE A AUTORA:
Edilaine Rodrigues de Gois Tedeschi. Advogada, inscrita na OAB/SP nº 134.890, especialista em Direito Civil, Processo Civil e Direito Tributário, pós-graduada pela Escola Superior da Advocacia com MBA pela Fundação Getúlio Vargas.