CRÔNICA: O GUIM-GUIM PREMIADO

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cabeca-ricchetti CRÔNICA: O GUIM-GUIM PREMIADO

Alguém pode, olhando para o título desta crônica, já se perguntar o que quer dizer essa palavra guim-guim.

Por mais incrível que possa parecer, se alguém consultar um dicionário lá estará escrito: “Guim-Guim, tampinha metálica de garrafa, expressão usada somente pelos habitantes da cidade de São Manuel no Estado de São Paulo – Brasil.”

Ou seja, esta é curiosamente uma expressão que existe somente na minha cidade natal e ninguém, até hoje, sabe dizer de onde e nem como ela teria surgido.

Sabemos, por exemplo, que durante muitos anos foi comum se utilizar do guim-guim, encapado de papel alumínio de cigarro, para enfeitar as ruas durante a procissão de Corpus Christi e para termos uma ideia, desde quando existe essa palavra, a própria tradição de enfeitar as ruas no Corpus Christi na cidade data de 1949.

Nesses tempos os trabalhos na rua eram inicialmente feitos à base de flores e com o passar do tempo, novos materiais começaram a ser utilizados, entre eles o pó de café, o vidro moído, o bagaço de cana e entre eles todos estava lá também o protagonista desta minha crônica o nosso guim-guim.

Um dos locais, obviamente, em que se podia encontrar um guim-guim em quantidade, eram nos bares da cidade. Durante os anos 60 e 70 o Bar Colonial foi um desses bares de grande referência e quem viveu essa época na cidade, com certeza, conheceu o seu proprietário, o impagável João Franco, com sua simpatia ímpar e muito conhecido pela pizza deliciosa, que só ele sabia fazer.

O bar Colonial estava localizado num enorme sobrado de esquina, de uma das áreas mais centrais da cidade, na confluência da rua Gomes Faria com a Epitácio Pessoa, em frente ao Jardim Municipal e era o ponto de encontro da juventude, nas noites de sábado, para fazer o que se chama popularmente hoje, entre os jovens, de ‘esquenta’, ou seja, era o local para se beber antes dos bailes.

Mas todo fato tem que ter o seu contexto, cabe lembrar que nos anos 60/70 era comum que menores bebessem sob o conhecimento e consentimento dos proprietários dos bares e até dos próprios pais, mesmo sabendo todos, que era proibido, por lei, servir bebidas a menores de idade.

Me lembro por exemplo, que nessa época, havia na cidade a Escola Agrícola, uma escola em regime de internato, frequentada por alunos vindos de todos os cantos do Brasil e era ali também no bar Colonial, que eles se reuniam para beber, o que hoje se chama de ‘Samba’, uma mistura de cachaça com Coca-Cola.

Mas falando nessas tradições e nos usos e costumes da terrinha, era ali também, no próprio bar Colonial, que durante o dia, inúmeros munícipes, passavam para tomar o cafezinho, a sua cervejinha, comer um Bauru ou então se refrescar com um refrigerante bem gelado, cuja marca mais comum e famosa era o Guaraná Antártica.

Entre esses frequentadores habitues, havia um Major reformado do Exército, que todos os dias, impreterivelmente no começo da tarde, costumava passar pelo bar, para tomar o seu Guaraná Antártica, enquanto ‘batia um papo’ com os amigos que costumavam jogar cartas na sede do Clube Recreativo, situada exatamente na parte superior do mesmo sobrado, onde se situava o bar.

Nos anos 60/70, os chamados anos dourados, todas as empresas de refrigerantes e cervejas, como as tradicionais Antártica e Brahma, visando aumentar o consumo, criavam inúmeras campanhas publicitárias, com farta distribuição de prêmios.

Normalmente esses prêmios eram instantâneos e vinham estampados no interior da tampinha, na sua parte metálica, e se verificava se era ou não premiado com a retirada da cortiça que cobria o seu fundo.

Na enorme lista de prêmios, informada pela Antártica, num daqueles anos, através de maçantes propagandas em rádio, tv e jornal, havia uma em particular que incluía um automóvel Volkswagen zero km, o nosso famoso fusca, que era um dos poucos carros fabricados no Brasil e sonho de muitos.

Conta a lenda que foi num desses encontros vespertinos dos amigos do carteado e o Major, para bater aquele papo, aliado ao velho hábito dele em tomar o seu refrigerante gelado, que o pessoal do carteado, teve a ideia de aplicar uma ‘pegadinha’ no querido militar.

Então, um deles solicitou a um dos melhores desenhistas da cidade que fizesse, exatamente no fundo de um guim-guim do Guaraná Antártica, o refrigerante preferido do Major, após a retirada cuidadosa da cobertura de cortiça, um perfeito desenho de um fusca.

Na sequência recolocaram cuidadosamente a cortiça no seu devido lugar e combinaram então com o João Franco, o simpático proprietário do bar, que assim que abrisse o guaraná para o Major, trocasse rapidamente o guim-guim original pelo “falso premiado”, antes que ele percebesse.

E assim foi feito….

Testemunhas dizem que o velho Major, ao ver o desenho do fusca no fundo do metálico, estalou os olhos e ficou completamente branco, enquanto as suas mãos tremiam e suavam. Ele então teria cerrado as mãos apertando o guim-guim, como se estivesse com o próprio fusca entre os dedos…

Os amigos do carteado e outros frequentadores do bar, que também sabiam do que havia sido preparado para o Major, para completar a farsa, rodearam rapidamente o militar e insistiam aos gritos para ver a tampinha com o fusca desenhado:

  • Deixa a gente ver Major, deixa a gente ver!
  • @#% Major! O Sr. ganhou o Fusca???

O Major relutante que alguém tomasse o guim-guim premiado das suas mãos, mantinha ela bem fechada e gritava:

  • Não mostro não!
  • Não mostro não, o fusca é meu!

Dias depois, o velho militar, ao checar junto ao Distribuidor Antártica local descobriu, a duras penas, que a tampinha com o fusca estampado não passava de uma bela brincadeira dos amigos!

Coisas da terra do guim-guim…

José Luiz Ricchetti – 18/04/2023

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Alguém pode, olhando para o título desta crônica, já se perguntar o que quer dizer essa palavra guim-guim.

Por mais incrível que possa parecer, se alguém consultar um dicionário lá estará escrito: “Guim-Guim, tampinha metálica de garrafa, expressão usada somente pelos habitantes da cidade de São Manuel no Estado de São Paulo – Brasil.”

Ou seja, esta é curiosamente uma expressão que existe somente na minha cidade natal e ninguém, até hoje, sabe dizer de onde e nem como ela teria surgido.

Sabemos, por exemplo, que durante muitos anos foi comum se utilizar do guim-guim, encapado de papel alumínio de cigarro, para enfeitar as ruas durante a procissão de Corpus Christi e para termos uma ideia, desde quando existe essa palavra, a própria tradição de enfeitar as ruas no Corpus Christi na cidade data de 1949.

Nesses tempos os trabalhos na rua eram inicialmente feitos à base de flores e com o passar do tempo, novos materiais começaram a ser utilizados, entre eles o pó de café, o vidro moído, o bagaço de cana e entre eles todos estava lá também o protagonista desta minha crônica o nosso guim-guim.

Um dos locais, obviamente, em que se podia encontrar um guim-guim em quantidade, eram nos bares da cidade. Durante os anos 60 e 70 o Bar Colonial foi um desses bares de grande referência e quem viveu essa época na cidade, com certeza, conheceu o seu proprietário, o impagável João Franco, com sua simpatia ímpar e muito conhecido pela pizza deliciosa, que só ele sabia fazer.

O bar Colonial estava localizado num enorme sobrado de esquina, de uma das áreas mais centrais da cidade, na confluência da rua Gomes Faria com a Epitácio Pessoa, em frente ao Jardim Municipal e era o ponto de encontro da juventude, nas noites de sábado, para fazer o que se chama popularmente hoje, entre os jovens, de ‘esquenta’, ou seja, era o local para se beber antes dos bailes.

Mas todo fato tem que ter o seu contexto, cabe lembrar que nos anos 60/70 era comum que menores bebessem sob o conhecimento e consentimento dos proprietários dos bares e até dos próprios pais, mesmo sabendo todos, que era proibido, por lei, servir bebidas a menores de idade.

Me lembro por exemplo, que nessa época, havia na cidade a Escola Agrícola, uma escola em regime de internato, frequentada por alunos vindos de todos os cantos do Brasil e era ali também no bar Colonial, que eles se reuniam para beber, o que hoje se chama de ‘Samba’, uma mistura de cachaça com Coca-Cola.

Mas falando nessas tradições e nos usos e costumes da terrinha, era ali também, no próprio bar Colonial, que durante o dia, inúmeros munícipes, passavam para tomar o cafezinho, a sua cervejinha, comer um Bauru ou então se refrescar com um refrigerante bem gelado, cuja marca mais comum e famosa era o Guaraná Antártica.

Entre esses frequentadores habitues, havia um Major reformado do Exército, que todos os dias, impreterivelmente no começo da tarde, costumava passar pelo bar, para tomar o seu Guaraná Antártica, enquanto ‘batia um papo’ com os amigos que costumavam jogar cartas na sede do Clube Recreativo, situada exatamente na parte superior do mesmo sobrado, onde se situava o bar.

Nos anos 60/70, os chamados anos dourados, todas as empresas de refrigerantes e cervejas, como as tradicionais Antártica e Brahma, visando aumentar o consumo, criavam inúmeras campanhas publicitárias, com farta distribuição de prêmios.

Normalmente esses prêmios eram instantâneos e vinham estampados no interior da tampinha, na sua parte metálica, e se verificava se era ou não premiado com a retirada da cortiça que cobria o seu fundo.

Na enorme lista de prêmios, informada pela Antártica, num daqueles anos, através de maçantes propagandas em rádio, tv e jornal, havia uma em particular que incluía um automóvel Volkswagen zero km, o nosso famoso fusca, que era um dos poucos carros fabricados no Brasil e sonho de muitos.

Conta a lenda que foi num desses encontros vespertinos dos amigos do carteado e o Major, para bater aquele papo, aliado ao velho hábito dele em tomar o seu refrigerante gelado, que o pessoal do carteado, teve a ideia de aplicar uma ‘pegadinha’ no querido militar.

Então, um deles solicitou a um dos melhores desenhistas da cidade que fizesse, exatamente no fundo de um guim-guim do Guaraná Antártica, o refrigerante preferido do Major, após a retirada cuidadosa da cobertura de cortiça, um perfeito desenho de um fusca.

Na sequência recolocaram cuidadosamente a cortiça no seu devido lugar e combinaram então com o João Franco, o simpático proprietário do bar, que assim que abrisse o guaraná para o Major, trocasse rapidamente o guim-guim original pelo “falso premiado”, antes que ele percebesse.

E assim foi feito….

Testemunhas dizem que o velho Major, ao ver o desenho do fusca no fundo do metálico, estalou os olhos e ficou completamente branco, enquanto as suas mãos tremiam e suavam. Ele então teria cerrado as mãos apertando o guim-guim, como se estivesse com o próprio fusca entre os dedos…

Os amigos do carteado e outros frequentadores do bar, que também sabiam do que havia sido preparado para o Major, para completar a farsa, rodearam rapidamente o militar e insistiam aos gritos para ver a tampinha com o fusca desenhado:

  • Deixa a gente ver Major, deixa a gente ver!
  • @#% Major! O Sr. ganhou o Fusca???

O Major relutante que alguém tomasse o guim-guim premiado das suas mãos, mantinha ela bem fechada e gritava:

  • Não mostro não!
  • Não mostro não, o fusca é meu!

Dias depois, o velho militar, ao checar junto ao Distribuidor Antártica local descobriu, a duras penas, que a tampinha com o fusca estampado não passava de uma bela brincadeira dos amigos!

Coisas da terra do guim-guim…

José Luiz Ricchetti – 18/04/2023

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