Crônica: A lição do cavalo cego

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cabeca-ricchetti Crônica: A lição do cavalo cego

Quando a maioria das pessoas ainda nem tinha ouvido falar de Campos do Jordão e muito antes desta estância climática se tornar famosa, eu tinha um tio, do lado materno, que tinha um sítio enorme no Jardim do Embaixador, um dos bairros mais lindos e elegantes da cidade, nas imediações da Vila Capivari.

Além da casa em estilo suíço, lembro muito bem que o sítio era entrecortado por um pequeno rio de águas claras e que ao atravessar uma pequena ponte havia uma tortuosa estradinha que avançava por um morro em cujo topo defrontávamos com uma enorme cocheira e muitos cavalos.

Durante o mês de julho, no período dos meus dez aos quatorze ou quinze anos, eu passei quase todas as minhas férias de inverno por lá.

Nesse período, além de brincar pela chácara toda, com meus primos e minhas primas eu adorava a chegada do sábado, quando o cavalariço arreava os cavalos e saíamos em grupo, junto com meus tios e primos, para passear pelo centro de Campos de Jordão na linda Vila do Capivari.

image-26 Crônica: A lição do cavalo cego

Eram muitos cavalos, todos muito lindos, mas tinha um deles em particular pelo qual eu tinha um carinho especial, que se chamava Conhaque, um lindo cavalo castanho claro.

Havia um outro cavalo também que eu achava o máximo, embora fosse bem mais jovem e arredio que o Conhaque que se chamava Apache, cujo nome me remetia àqueles filmes de cowboys e índios que sempre assistíamos no cinema. O Apache era um cavalo malhado de preto e branco.

O Conhaque e o Apache eram dois cavalos que andavam sempre juntos. Podíamos dizer que eram amigos inseparáveis.

Essas férias em Campos do Jordão nunca saíram da minha memória, especialmente pelos lindos passeios a cavalo que fazíamos por lá, numa época em que a cidade era bem calma, sem essa invasão turística que temos hoje.

Me lembro bem, de uma vez em especial, numa dessas férias de julho, que ao chegar no sítio, recebi a notícia de que o Conhaque, aquele cavalo que eu adorava, havia ficado muito doente e estava praticamente cego.

Meu tio comentou que apesar disso, ele não tinha sacrificado o animal, porque sabia o quanto todos nós, crianças, adorávamos o velho Conhaque.

Ao invés de sacrificá-lo, ele e o cavalariço, resolveram a situação com uma solução inusitada.

Assim, para mostrar a mim e aos meus primos o que tinham feito, eles nos levaram até o local, onde os cavalos costumavam ficar pastando, diariamente. 

Quando chegamos, logo percebemos, através da cerca, que eles haviam colocado, no pescoço do Apache, o cavalo mais novo e malhado, um pequeno sino, que fazia com que ao andar, o ruído sinalizasse para que lado ou direção ele estava indo.

Observando o Apache caminhar e o barulho do seu sino, percebemos que o Conhaque, o cavalo cego, seguia o som do sino, instalado no pescoço do seu amigo.

Meu tio então nos explicou que todos os dias os dois cavalos saiam juntos para comer, e que o Conhaque, através do som do sino, no pescoço do Apache, podia saber por onde ir e, no final do dia, o mesmo ruído o ajudava a voltar para o estábulo.

Ele então acrescentou:

– O Conhaque nunca se perde, e mesmo não podendo ver, sabe sempre onde está e para onde deve ir com a ajuda do seu inseparável amigo Apache. Ele segue o amigo com plena confiança, sabendo que está seguro.

Olhando os dois cavalos pastando tranquilamente, notamos que vez ou outra o Apache olhava para trás, esperando, que seu amigo Conhaque, o alcançasse.

Recordando aqueles momentos inesquecíveis da minha juventude eu comecei a pensar que assim, como meu tio tinha feito com o cavalo cego, Deus também não se desfaz de nós, só porque temos defeitos, fraquezas ou dúvidas.

Deus nunca nos abandona, mesmo quando somos cegos em momentos da vida e relutamos em aprender as muitas lições que são colocadas bem na frente dos nossos olhos.

Ao contrário, apesar das nossas falhas, Deus continua a cuidar de nós, e sempre nos envia alguma pessoa ou um amigo para nos ajudar e nos guiar, exatamente como o Apache fez com seu companheiro Conhaque.

Às vezes, durante a vida somos o cavalo cego, guiado pelo sino das pessoas e dos amigos, outras vezes somos o cavalo que guia o amigo cego, ajudando o a encontrar o caminho correto.

As verdadeiras amizades nem sempre são as mais antigas, mas sempre são aquelas que fazem a diferença na nossa vida, sendo como um sino que nos guia e nos mostra o caminho certo nesta nossa vida incerta.

José Luiz Ricchetti – 18/11/2021

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Quando a maioria das pessoas ainda nem tinha ouvido falar de Campos do Jordão e muito antes desta estância climática se tornar famosa, eu tinha um tio, do lado materno, que tinha um sítio enorme no Jardim do Embaixador, um dos bairros mais lindos e elegantes da cidade, nas imediações da Vila Capivari.

Além da casa em estilo suíço, lembro muito bem que o sítio era entrecortado por um pequeno rio de águas claras e que ao atravessar uma pequena ponte havia uma tortuosa estradinha que avançava por um morro em cujo topo defrontávamos com uma enorme cocheira e muitos cavalos.

Durante o mês de julho, no período dos meus dez aos quatorze ou quinze anos, eu passei quase todas as minhas férias de inverno por lá.

Nesse período, além de brincar pela chácara toda, com meus primos e minhas primas eu adorava a chegada do sábado, quando o cavalariço arreava os cavalos e saíamos em grupo, junto com meus tios e primos, para passear pelo centro de Campos de Jordão na linda Vila do Capivari.

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Eram muitos cavalos, todos muito lindos, mas tinha um deles em particular pelo qual eu tinha um carinho especial, que se chamava Conhaque, um lindo cavalo castanho claro.

Havia um outro cavalo também que eu achava o máximo, embora fosse bem mais jovem e arredio que o Conhaque que se chamava Apache, cujo nome me remetia àqueles filmes de cowboys e índios que sempre assistíamos no cinema. O Apache era um cavalo malhado de preto e branco.

O Conhaque e o Apache eram dois cavalos que andavam sempre juntos. Podíamos dizer que eram amigos inseparáveis.

Essas férias em Campos do Jordão nunca saíram da minha memória, especialmente pelos lindos passeios a cavalo que fazíamos por lá, numa época em que a cidade era bem calma, sem essa invasão turística que temos hoje.

Me lembro bem, de uma vez em especial, numa dessas férias de julho, que ao chegar no sítio, recebi a notícia de que o Conhaque, aquele cavalo que eu adorava, havia ficado muito doente e estava praticamente cego.

Meu tio comentou que apesar disso, ele não tinha sacrificado o animal, porque sabia o quanto todos nós, crianças, adorávamos o velho Conhaque.

Ao invés de sacrificá-lo, ele e o cavalariço, resolveram a situação com uma solução inusitada.

Assim, para mostrar a mim e aos meus primos o que tinham feito, eles nos levaram até o local, onde os cavalos costumavam ficar pastando, diariamente. 

Quando chegamos, logo percebemos, através da cerca, que eles haviam colocado, no pescoço do Apache, o cavalo mais novo e malhado, um pequeno sino, que fazia com que ao andar, o ruído sinalizasse para que lado ou direção ele estava indo.

Observando o Apache caminhar e o barulho do seu sino, percebemos que o Conhaque, o cavalo cego, seguia o som do sino, instalado no pescoço do seu amigo.

Meu tio então nos explicou que todos os dias os dois cavalos saiam juntos para comer, e que o Conhaque, através do som do sino, no pescoço do Apache, podia saber por onde ir e, no final do dia, o mesmo ruído o ajudava a voltar para o estábulo.

Ele então acrescentou:

– O Conhaque nunca se perde, e mesmo não podendo ver, sabe sempre onde está e para onde deve ir com a ajuda do seu inseparável amigo Apache. Ele segue o amigo com plena confiança, sabendo que está seguro.

Olhando os dois cavalos pastando tranquilamente, notamos que vez ou outra o Apache olhava para trás, esperando, que seu amigo Conhaque, o alcançasse.

Recordando aqueles momentos inesquecíveis da minha juventude eu comecei a pensar que assim, como meu tio tinha feito com o cavalo cego, Deus também não se desfaz de nós, só porque temos defeitos, fraquezas ou dúvidas.

Deus nunca nos abandona, mesmo quando somos cegos em momentos da vida e relutamos em aprender as muitas lições que são colocadas bem na frente dos nossos olhos.

Ao contrário, apesar das nossas falhas, Deus continua a cuidar de nós, e sempre nos envia alguma pessoa ou um amigo para nos ajudar e nos guiar, exatamente como o Apache fez com seu companheiro Conhaque.

Às vezes, durante a vida somos o cavalo cego, guiado pelo sino das pessoas e dos amigos, outras vezes somos o cavalo que guia o amigo cego, ajudando o a encontrar o caminho correto.

As verdadeiras amizades nem sempre são as mais antigas, mas sempre são aquelas que fazem a diferença na nossa vida, sendo como um sino que nos guia e nos mostra o caminho certo nesta nossa vida incerta.

José Luiz Ricchetti – 18/11/2021

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