Mudanças – Por José Luiz Ricchetti

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62135854-3C8B-4A81-BA9E-70634924E6D5-1024x685 Mudanças - Por José Luiz Ricchetti

Acho que o primeiro escritório que conheci, ainda criança, foi o do armazém da família, ali na minha querida cidade natal de São Manuel.

Ele era pequeno, ficava na parte de trás do armazém, bem atrás da caixa registradora. Era uma pequena sala com três escrivaninhas, um cofre grande e três ‘máquinas de escrever’, duas ‘Remington’ e uma Olivetti, marcas pioneiras e tradicionais da época

Curiosamente, e acho que poucos sabem disso, a invenção da máquina de escrever foi de um brasileiro, o padre Francisco Azevedo e seu invento é datado de 1861. Consta, que ele foi surrupiado por um americano, que o vendeu depois à família Remington, tradicional fabricante de armas nos USA e que iniciou a sua fabricação em escala industrial, em 1874.

Para aqueles, que nunca, sequer, viram uma máquina de escrever segue a descrição: “Máquinas construídas com tipos móveis, cujas letras e caracteres eram associadas às teclas que ao serem apertadas reproduziam sua respectiva letra ou caractere numa folha de papel que era introduzida através de um cilindro rotativo”.

Bem, voltando ao escritório do armazém, me lembro que suas escrivaninhas eram feitas de madeira de lei, muito pesadas, as cadeiras também eram todas de madeira e tinham o logotipo da marca ‘Cimo’ no seu encosto. No tampo das mesas ainda havia um pequeno buraco para encaixar o tinteiro, que eram vidros cheios de tinta, uma vez as canetas da época eram todas ‘alimentadas’ com tinta, mergulhando a sua pena diretamente nesses vidros.

Muito tempo depois, quando sai de São Manuel para fazer engenharia, vim a conhecer, no meu primeiro emprego, os amplos escritórios das áreas de engenharia, comercial e administrativa, com seus longos corredores e inúmeras mesas, uma atrás da outra, quase a perder de vista.

Os escritórios desse meu início de carreira, em meados dos anos 70, início dos 80, eram comandados pelos seus chefes de departamento, gerentes e diretores, que tinham suas respectivas salas privativas e fechadas para depois, com o tempo, irem sendo paulatinamente restruturadas para restar, no final dos anos 90, praticamente as salas de diretores.

Nesse tempo, vigoravam as famosas estruturas piramidais, chamadas à época de ‘Escola Taylor de Administração de Empresas’.

Bem, com muitas outras mudanças contínuas, desembarcarmos em meados dos anos 2000 nos sistemas utilizados, até o recente ano de 2019 onde salas de ‘coworking’ abrigam mesas coletivas, com infraestrutura de ‘wireless’ e rodízio de pessoas, incluindo todos os gestores, alternando trabalhos em regime de ‘office’ e ‘home office’.

Hoje, neste ano de 2020, em plena pandemia de Corona Vírus, podemos dizer, sem medo de errar, que a tendência, no futuro, já presente é de que a maioria absoluta dos grandes escritórios sejam transformados em espaços para eventuais reuniões entre seus principais gestores e com a maior parte dos trabalhos passando a ser desenvolvida em sistema de ‘home office’.

Assim quem quiser, no futuro, saber o que era esse tal de ‘escritório’ terá que ir a um museu ou recorrer a filmes e fotografias, pois com certeza eles, os escritórios, como o conhecemos em 2019 e antes disso, serão apenas parte da história.

Recentemente num artigo do Ruy Castro, ele citou o filme ‘Se meu apartamento falasse’ de Billy Wilder, onde o cenógrafo genialmente teria simulado um grande escritório, desses antigos, utilizando fotos de pessoas coladas em papelão e fez uma alusão comparativa entre essa representação cenográfica e como o indivíduo se sentia nessa época, ou seja, como verdadeiro funcionário de papel, sem qualquer importância relativa….

O fato é que todas essas grandes mudanças que tem ocorrido, não só em relação aos espaços de trabalho, mas também em relação a tudo isso que está acontecendo hoje conosco e que irá, com certeza, afetar todo o relacionamento entre as pessoas, principalmente entre aqueles que trabalham, fez com que eu me lembrasse de uma história curiosa que ocorreu com um amigo, exatamente sobre isso, ‘Mudanças’.

Este meu colega, em determinado momento da sua bem-sucedida carreira de executivo, foi designado para assumir o cargo de Diretor Geral, de uma antiga fábrica de autopeças para automóveis, num pais da Ásia.

Orgulhoso do salto na carreira e muito dono de si na nova posição, ele no seu primeiro dia de trabalho, naquele exótico país asiático, se levantou muito cedo e começou visitando todos os departamentos da velha fábrica, visando conhecer todo o seu staff e as instalações do local.

Ao entrar no departamento de engenharia, ele ficou inconformado, ao verificar que na sala de projetos, todos os engenheiros e projetistas trabalhavam na posição de cócoras, agachados sobre as folhas de desenhos, dispostas todas no próprio chão do escritório, sem nenhuma cadeira, prancheta ou uma mesa de trabalho.

Inconformado, sem perguntar nada a ninguém, imediatamente solicitou ao seu assessor, que fizesse um levantamento de todas as necessidades de móveis, nos vários setores da empresa e que comprasse o número correto de pranchetas e mesas para o departamento de engenharia.

– Não quero ver mais ninguém trabalhando no chão, isto é desumano, inconcebível! Disse ele a todos que o acompanhavam na visita, naquele primeiro dia.

Assim que os novos móveis chegaram e foram instalados, ele fez questão de ver ‘in loco’ o resultado, e foi em primeiro lugar, visitar a sala de projetos, no departamento de engenharia, onde tinha visto os engenheiros e projetistas trabalhando agachados sobre os desenhos.

Quando entrou na sala, logo pôde ver, orgulhoso, os novos móveis adquiridos, modernos e de última geração, todos bem-dispostos em fileiras num layout organizado.

Mas quando ele olhou nos detalhes, pasmem! Percebeu que todos os engenheiros e projetistas, continuavam lá na mesma posição, de cócoras e agachados, mas só que agora, em cima de cada uma das novas mesas e pranchetas….

O que podemos concluir com isso?

Acho que existem pelo menos três grandes lições nessa história:

1) Para efetuarmos qualquer mudança é preciso antes conversar com os envolvidos e entender suas tradições, suas características e a sua maneira de pensar.

2) Se você não gosta de alguma coisa, procure mudá-la. Mas se não puder mudá-las, é melhor repensar as suas atitudes.

E a terceira e talvez a mais importante:

3) Toda mudança, por menor que seja, sempre traz junto um grande aprendizado.

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Acho que o primeiro escritório que conheci, ainda criança, foi o do armazém da família, ali na minha querida cidade natal de São Manuel.

Ele era pequeno, ficava na parte de trás do armazém, bem atrás da caixa registradora. Era uma pequena sala com três escrivaninhas, um cofre grande e três ‘máquinas de escrever’, duas ‘Remington’ e uma Olivetti, marcas pioneiras e tradicionais da época

Curiosamente, e acho que poucos sabem disso, a invenção da máquina de escrever foi de um brasileiro, o padre Francisco Azevedo e seu invento é datado de 1861. Consta, que ele foi surrupiado por um americano, que o vendeu depois à família Remington, tradicional fabricante de armas nos USA e que iniciou a sua fabricação em escala industrial, em 1874.

Para aqueles, que nunca, sequer, viram uma máquina de escrever segue a descrição: “Máquinas construídas com tipos móveis, cujas letras e caracteres eram associadas às teclas que ao serem apertadas reproduziam sua respectiva letra ou caractere numa folha de papel que era introduzida através de um cilindro rotativo”.

Bem, voltando ao escritório do armazém, me lembro que suas escrivaninhas eram feitas de madeira de lei, muito pesadas, as cadeiras também eram todas de madeira e tinham o logotipo da marca ‘Cimo’ no seu encosto. No tampo das mesas ainda havia um pequeno buraco para encaixar o tinteiro, que eram vidros cheios de tinta, uma vez as canetas da época eram todas ‘alimentadas’ com tinta, mergulhando a sua pena diretamente nesses vidros.

Muito tempo depois, quando sai de São Manuel para fazer engenharia, vim a conhecer, no meu primeiro emprego, os amplos escritórios das áreas de engenharia, comercial e administrativa, com seus longos corredores e inúmeras mesas, uma atrás da outra, quase a perder de vista.

Os escritórios desse meu início de carreira, em meados dos anos 70, início dos 80, eram comandados pelos seus chefes de departamento, gerentes e diretores, que tinham suas respectivas salas privativas e fechadas para depois, com o tempo, irem sendo paulatinamente restruturadas para restar, no final dos anos 90, praticamente as salas de diretores.

Nesse tempo, vigoravam as famosas estruturas piramidais, chamadas à época de ‘Escola Taylor de Administração de Empresas’.

Bem, com muitas outras mudanças contínuas, desembarcarmos em meados dos anos 2000 nos sistemas utilizados, até o recente ano de 2019 onde salas de ‘coworking’ abrigam mesas coletivas, com infraestrutura de ‘wireless’ e rodízio de pessoas, incluindo todos os gestores, alternando trabalhos em regime de ‘office’ e ‘home office’.

Hoje, neste ano de 2020, em plena pandemia de Corona Vírus, podemos dizer, sem medo de errar, que a tendência, no futuro, já presente é de que a maioria absoluta dos grandes escritórios sejam transformados em espaços para eventuais reuniões entre seus principais gestores e com a maior parte dos trabalhos passando a ser desenvolvida em sistema de ‘home office’.

Assim quem quiser, no futuro, saber o que era esse tal de ‘escritório’ terá que ir a um museu ou recorrer a filmes e fotografias, pois com certeza eles, os escritórios, como o conhecemos em 2019 e antes disso, serão apenas parte da história.

Recentemente num artigo do Ruy Castro, ele citou o filme ‘Se meu apartamento falasse’ de Billy Wilder, onde o cenógrafo genialmente teria simulado um grande escritório, desses antigos, utilizando fotos de pessoas coladas em papelão e fez uma alusão comparativa entre essa representação cenográfica e como o indivíduo se sentia nessa época, ou seja, como verdadeiro funcionário de papel, sem qualquer importância relativa….

O fato é que todas essas grandes mudanças que tem ocorrido, não só em relação aos espaços de trabalho, mas também em relação a tudo isso que está acontecendo hoje conosco e que irá, com certeza, afetar todo o relacionamento entre as pessoas, principalmente entre aqueles que trabalham, fez com que eu me lembrasse de uma história curiosa que ocorreu com um amigo, exatamente sobre isso, ‘Mudanças’.

Este meu colega, em determinado momento da sua bem-sucedida carreira de executivo, foi designado para assumir o cargo de Diretor Geral, de uma antiga fábrica de autopeças para automóveis, num pais da Ásia.

Orgulhoso do salto na carreira e muito dono de si na nova posição, ele no seu primeiro dia de trabalho, naquele exótico país asiático, se levantou muito cedo e começou visitando todos os departamentos da velha fábrica, visando conhecer todo o seu staff e as instalações do local.

Ao entrar no departamento de engenharia, ele ficou inconformado, ao verificar que na sala de projetos, todos os engenheiros e projetistas trabalhavam na posição de cócoras, agachados sobre as folhas de desenhos, dispostas todas no próprio chão do escritório, sem nenhuma cadeira, prancheta ou uma mesa de trabalho.

Inconformado, sem perguntar nada a ninguém, imediatamente solicitou ao seu assessor, que fizesse um levantamento de todas as necessidades de móveis, nos vários setores da empresa e que comprasse o número correto de pranchetas e mesas para o departamento de engenharia.

– Não quero ver mais ninguém trabalhando no chão, isto é desumano, inconcebível! Disse ele a todos que o acompanhavam na visita, naquele primeiro dia.

Assim que os novos móveis chegaram e foram instalados, ele fez questão de ver ‘in loco’ o resultado, e foi em primeiro lugar, visitar a sala de projetos, no departamento de engenharia, onde tinha visto os engenheiros e projetistas trabalhando agachados sobre os desenhos.

Quando entrou na sala, logo pôde ver, orgulhoso, os novos móveis adquiridos, modernos e de última geração, todos bem-dispostos em fileiras num layout organizado.

Mas quando ele olhou nos detalhes, pasmem! Percebeu que todos os engenheiros e projetistas, continuavam lá na mesma posição, de cócoras e agachados, mas só que agora, em cima de cada uma das novas mesas e pranchetas….

O que podemos concluir com isso?

Acho que existem pelo menos três grandes lições nessa história:

1) Para efetuarmos qualquer mudança é preciso antes conversar com os envolvidos e entender suas tradições, suas características e a sua maneira de pensar.

2) Se você não gosta de alguma coisa, procure mudá-la. Mas se não puder mudá-las, é melhor repensar as suas atitudes.

E a terceira e talvez a mais importante:

3) Toda mudança, por menor que seja, sempre traz junto um grande aprendizado.

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